Terça-Feira, 08 de Outubro de 2024

Crimes praticados diariamente têm deixado picoenses aterrorizados

Publicado em 20/01/2016
Por Edson Costa
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José Antonio foi assassinado na noite desta quinta-feira, 28/Folha Atual

 

Por  Marta Soares e Edson Costa

O medo está reinando na cidade de Picos. A criminalidade tomou conta e os picoenses que há tão pouco tempo tinham uma vida tranquila passaram a ser reféns de bandidos que diariamente praticam furtos e roubos em toda cidade. A equipe do Jornal e Portal Folha Atual produziu uma reportagem especial onde mostra a crescente violência que se estendeu também para os bairros e zona rural da cidade de Picos.

Diante das constantes notícias sobre furtos e roubos em toda a cidade de Picos, o Folha Atual trouxe na edição de Nº 68 do Jornal impresso, que circula em Picos e região nesta sexta-feira, 29, uma página inteira para mostrar que a violência está em todos os bairros, até os considerados “bairros elitizados” e bairros que até bem pouco tempo eram tidos como seguros.

Antes de continuar com a reportagem especial, vamos explicar brevemente a diferença entre furtos e roubos. Furto é toda ação criminosa onde o elemento toma algum pertence da vítima sem contato nenhum com a mesma. Equivale a furto os arrombamentos às lojas e comércios, quando estes acontecem sem a presença das vítimas. Já no roubo, durante a ação, o bandido usa de ameaça contra a vítima para subtrair da mesma algum pertence. O mesmo equivale a assalto.

Dito isto, continuaremos a reportagem com o depoimento de vítimas de diferentes bairros da cidade, além do centro e da zona rural. A equipe visitou os bairros Junco, COHAB, Pedrinhas, Umari, Ipueiras, São José, Bomba, Canto da Várzea, Boa Vista, e ainda, o Centro da cidade e o povoado Lagoa Comprida.

Confira depoimentos de picoenses vítimas da criminalidade:

JUNCO

Kelles Mororó é dono do restaurante “Panela de Barro” no bairro Junco e foi assaltado há cerca de 15 dias, em um dia de domingo, às 14h30. Dois homens anunciaram o assalto e sob a mira de uma arma de fogo Kelles entregou seus pertences: “ao descerem da moto, os dois elementos vieram direto na minha direção e mandaram que eu entregasse meu cordão de ouro, pulseira e meu relógio. Levaram ainda a chave de dois automóveis e fugiram pela contramão. Todos os dias a gente vê isso acontecer, dá medo. Quando dá 2h da tarde, que tá acabando o movimento gente pensa logo em fechar”, disse.

 

COHAB

Elenita Barbosa é proprietária do Supermercado Barbosa, no Conjunto Habitacional Petrônio Portela, COHAB. O supermercado de Elenita já sofreu três assaltos e para tentar coibir os crimes, ela instalou um circuito de câmeras de vigilância. “Já fui assaltada três vezes, todas as vezes à mão marmada e encapuzados. Eles já chegam dando soco e mandando abrir a gaveta. Depois do último assalto resolvemos instalar esse equipamento de segurança por prevenção, porque ajuda, de certa forma ajuda. Auxilia também a polícia a identificar os meliantes. Aqui no bairro a gente não pode mais andar sozinho depois das 10h da noite, nem pode ficar numa calçada. Fiz um curso no SENAI, perto da minha casa, mas como acabava às 21h40 eu ia de carro porque tinha medo. Aqui já não é mais tranquilo”.

 

PEDRINHAS

José Araújo possui uma padaria no bairro Pedrinhas, a “Panificadora Araújo” e há 15 dias foi vítima de um arrombamento. Segundo ele, esta não foi a primeira vez: “Arrombaram a porta dos fundos e levaram refrigerantes, sorvete, chocolates e um pouco de dinheiro que tinha no caixa. Levaram muita coisa e levaram em uma D-20, segundo uma pessoa do bairro que disse que viu outra pessoas levando essas coisas. Essa aqui já é a 3ª vez que fazem isso. Já reforcei o portão, porta e agora vou instalar câmeras. A sensação é de insegurança porque por mais que a gente coloque a câmera, se a gente estiver no estabelecimento numa hora dessas faz medo eles reagirem contra a gente”.

 

UMARÍ

Ana Rosa Batista é proprietária da “Pizzaria e Lanchonete Sabores e Festa”, no bairro Umarí. No sábado passado ela foi vítima de um assalto onde os elementos ainda efetuaram um disparo de arma de fogo. “Em seis anos que a gente trabalha aqui, essa foi a primeira vez, mas também só faltava a gente, o restante dos donos de comércio todos já foram assaltados. Os clientes que estavam lá foram disseram que dois homens chegaram de moto e capacete e anunciaram o assalto. Levaram os celulares de três meninas e ao sair ainda efetuaram o disparo pra cima. O sentimento é de frustração, a gente é cidadão, paga nossos impostos e numa hora dessas, a gente trabalhando e vem um elemento e perturba a gente, o cliente. Uma das vítimas já tinha sido assaltada três vezes. Na redondeza a maioria dos comércios já foi assaltado”.

 

LAGOA COMPRIDA

O “Mercadinho Santana”, localizado na Lagoa Comprida, zona rural de Picos, pertence à família de Sávio Oliveira. Após oito assaltos os proprietários tiveram que gradear todo o comércio como forma de dificultar a ação dos bandidos. “A falta de policiamento aqui é enorme e há muita insegurança. Já fomos assaltados oito vezes e nunca deram uma resposta. Tá com cinco anos de um dos assaltos e ainda ontem (26) minha mãe foi para uma audiência com o acusado, que inclusive já está solto. A gente sente muita impunidade, não temos a quem recorrer. Eles vêm assaltar a gente e não vamos mais nem atrás de polícia e nem de nada, a gente sabe que não dá mais jeito. A última vez foi em dezembro de 2015. No total foram seis assaltos à mão armada e dois arrombamentos”.

 

IPUEIRAS

No “Bar do Tenente”, que pertence a Firmino Raimundo Leal, o último domingo foi de terror. Sentado com alguns clientes na porta do comércio, Firmino foi surpreendido por dois homens que chegaram ao local em uma moto e logo anunciaram o assalto. “Com arma em punho, fomos obrigados a entregar nossos pertences e dinheiro. Como o pessoal demorou a entregar, eles efetuaram um disparo como forma de intimidação. Arrancaram minha corrente de ouro e levaram o dinheiro que estava na gaveta. Quando iam saindo apontaram a arma pra gente e alertaram que não olhássemos pra eles, aí montaram na moto e saíram. Acionamos a polícia, ela veio, mas não encontrou mais eles. Além desse assalto, meu comércio foi arrombado três vezes”.

 

IPUEIRAS

Salvador da Silva Neto é dono do “Mercadinho Liboense”, no bairro Ipueiras. Após sete assaltos ele resolveu fechar todo o comércio com grades e controlar quem entra. “Fui vítima de assalto por várias vezes e em decorrência disso, cheguei ao ponto de colocar um portão em meu comércio, mas isso não quer dizer que a gente não tenha medo, é uma pequena forma de proporcionar um pouco se segurança em nosso trabalho. Não é que com a grade tenha resolvido, mas me sinto mais à vontade para trabalhar”.

 

SÃO JOSÉ

Márcio Oliveira é dono da ”Drogaria Freitas”, no bairro São José e no último domingo, 24, também teve seu estabelecimento como alvo de assaltantes. “Por volta das 21h uma mulher veio, pediu informação sobre um produto e saiu. Instantes depois ela retornou com um casal. Meu irmão que estava aqui na hora, quando ele foi buscar o produto solicitado pela mulher, o homem passou para o outro lado do balcão e com uma faca ameaçou meu irmão e pedindo dinheiro. A mulher também ficou agressiva e no assalto levaram dinheiro e um tablet. Depois subiram na moto e foram embora. Em 2015 tive a farmácia assaltada também, levaram até a minha moto, mas consegui recuperá-la. Fica só o prejuízo e a insatisfação da gente. O bairro aqui é menos policiado e esse pessoal só faz o que quer”.

 

BOMBA

Allan de Sousa, dono da “Allan Auto Peças”, teve seu comércio como alvo de bandidos em plena 11h da manhã de uma sexta-feira, 08 de julho. “Esse foi o meu presente de aniversário. Eu estava no computador fazendo uma venda quando me deparei com os dois homens armados me pedindo para tirar o relógio e a pulseira de ouro. O outro homem já estava no caixa mandando que a funcionária entregasse o dinheiro que lá estava. Foi uma ação muito rápida, coisa de uns 30 segundos, mas o sentimento de impunidade ficou porque é o tipo de coisa que está acontecendo diariamente e em todos os bairros. Depois desse assalto instalei câmeras de segurança para monitorar o local. Meu apelo às autoridades é que haja mais policiamento na cidade. A bandidagem perdeu o medo”.

 

CANTO DA VÁRZEA

A empresária Audilene Barbosa, dona do “Supermercado Barbosa” e da loja “Audi Modas”, já perdeu as contas de quantas vezes teve seus comércios assaltados. “A loja e o supermercado já foram arrombados uma vez cada um e o supermercado já teve dois assaltos à mão armada. Esse é um assunto que me deixa nervosa porque já fui vítima várias vezes, já perdi as contas. Tenho investido em segurança, coloquei câmeras, alarmes e grades em minha loja. Todo cuidado que se pode ter, eu já tenho feito. Quando a gente se previne de uma maneira, o bandido vem e encontra outra, inventam um golpe novo. A sociedade, os gestores, as autoridades fazem o seu papel, mas pra isso a gente não tem solução, essa que é a verdade”.

 

CENTRO

Não bastasse ser rendido por um assaltante na porta de casa, o empresário Francisco Antônio, o Bimbim, do “Atacadão das Confecções”, teve sua loja como alvo de assaltantes que roubaram seus funcionários e o caixa da mesma. “Só esse mês fui vítima duas vezes, uma na minha casa e outra no comércio. Era 2h da tarde, eu estava chegando e fui surpreendido por dois elementos de moto, um ficou na moto e o outro entrou comigo em casa. Ele levou carteira, joias, celulares e dinheiro. No comercio foi no mesmo horário, levaram celulares dos meus funcionários e o apurado do dia”.

 

BOA VISTA

O “Mercadinho Macêdo”, que pertence à família de Gleidnilson Macêdo, também recebeu a visita de dois assaltantes, um deles com arma de fogo em punho. O assalto aconteceu há 15 dias, às 20h30 de uma sexta-feira. O pai de Gleidnilson tomava conta do comércio no momento do crime: “dois indivíduos em uma moto Pop 100 vermelha, todos dois aparentando ser menor de idade, chegaram e anunciaram o assalto. O que entrou pra efetuar o assalto era muito agressivo, já chegou ameaçando meu pai de morte caso ele não entregasse o dinheiro. Meu pai entregou o que tinha na gaveta e no bolso e eles saíram na moto. Se continuar desse jeito aí não vai ter como os cidadãos de bem trabalhar não. Fomos assaltados à mão armada outras duas vezes”.

 

Além das vítimas entrevistadas para esta reportagem, registramos ainda que na última semana outra loja no centro da cidade foi alvo de furto/arrombamento. Quatro pessoas arrombaram a loja “Tribos” durante a madrugada e levaram roupas, bolsas e calçados. Os autores não foram identificados e nem capturados.

No bairro Aerolandia, às 19h de segunda-feira, dia 25, dois elementos em uma moto invadiram a residência de Erasmo Alencar e por meia hora fizeram sua família como refém enquanto praticavam o roubo à residência. A vítima se preparava para sair da residência quando foi surpreendido pela chegada da moto e o anúncio do assalto. A filha da vítima conseguiu se trancar em um dos banheiros da casa. Foram levados da residência três anéis, um colar e duas pulseiras. Os autores também não foram capturados e nem identificados.

Também na segunda-feira, dia 25, dois homens em uma moto tentaram assaltar José Gilberto de Carvalho Filho, de 42 anos. Gilberto Filho carregava um malote da empresa em que trabalhava, a Moto Moura, para depósito quando foi surpreendido pela dupla. O crime ocorreu na BR 316, na altura do Terminal Rodoviário de Picos. Foram ouvidos dois disparos e um deles acertou a cabeça da vítima, que teve morte imediata. A vítima pilotava uma Honda XRE 300, de placa NIX – 9405. Os autores também não foram capturados e nem identificados.

E por último, a edição do impresso já tinha sido finalizada, surge à notícia de mais um crime na cidade. Foi registrado pela Polícia Militar um homicídio que vitimou o jovem José Antônio, de 18 anos, e deixou baleada a sua namorada de 17 anos. O crime aconteceu no povoado Retiro, zona rural de Picos, na noite desta quinta-feira, 28.

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“Somos também reféns, pois prendemos os menores e as leis os beneficiam”, diz comandante do 4º BPM

Ten. Cel. Vianna, comandante do 4º BPM

Diante do relato de tantas vítimas e sabendo que muitas outras não registram o furto ou roubo, procuramos o comandante da Polícia Militar em Picos, o Ten. Cel. Edwaldo Viana Lima. Para o comandante a repercussão maior em cima da divulgação desses crimes foram os dois últimos homicídios registrados no período de duas semanas. Segundo ele, há dois meses e meio não se registravam crimes de homicídio.

Quanto aos constantes roubos de celulares ele alega que 90% destes crimes são praticados por menores e alimentam o tráfico de drogas. “Infelizmente as leis beneficiam a eles. Temos uma lista de 26 menores que foram apreendidos somente este ano, destes apenas um continua apreendido. Nós, policiais militares também somos reféns, prendemos os menores e as leis os beneficiam. Esses mesmos que estão atuando hoje, são os mesmos que nós já apreendemos. Então, temos que dividir as responsabilidades”, disse ele.

Viana informou que esteve em Teresina essa semana para solicitar mais uma vez ao secretário de segurança do estado, Capitão Fábio Abreu, que as câmeras de segurança sejam instaladas na cidade. Para ele, as câmeras inibem os atos criminosos, pois todos saberão que a polícia estará acompanhando as imagens.

O efetivo atual da PM em Picos é de 86 homens, sete viaturas e 12 motos. Segundo o comandante o efetivo será reforçado de forma permanente e não temporária. Parte dos 86 novos soldados, formados nesta quinta-feira, dia 28, ficará em Picos. “Nós só vamos conseguir pegar esses elementos com abordagens e blitzen. Desde que assumi já apreendemos 16 armas de fogo, foi a cidade que mais apreendeu armas. Nossas blitzen serão direcionadas principalmente para a questão de armas, motos roubadas e verificação de documentos”.

Para o comandante a sensação de insegurança dos picoenses não condiz com a realidade: “Não condiz com a realidade. Nós mexemos com estatísticas e elas nos dizem que em termos de habitantes é a cidade que menos tem homicídios. Agora, a população e os comerciantes precisam ter cuidado. Não mandem dinheiro em malote com apenas um motoqueiro. Quanto aos bairros, vamos saturá-los com policiamento e a partir de agora, vamos acompanhar cada apreensão de menor e saber por que os menos que nós estamos apreendendo estão sendo soltos. Os menores delinquentes é que são a praga da sociedade. A família precisa assumir a responsabilidade e não transferi-la”.

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“O judiciário só solta porque tem uma lei coagindo o juiz a soltar”, diz juiz

Geneci Benevides, juiz de direito

Após a alegação do comandante do 4º BPM, de que a polícia faz o seu papel, mas as leis facilitam para que a justiça coloque estes elementos em liberdade, conversamos com o juiz Geneci Benevides, do Fórum de Picos. “Não posso falar pelo Judiciário, sou apenas um juiz, mas sobre a questão da violência e de que a polícia prende e a justiça solta, o que tenho a dizer é que quando a violência está crescendo trata-se de um problema na estrutura familiar. Vivo isso no meu dia a dia e a maioria dessas pessoas vêm de famílias desajustadas de alguma forma. Não é uma causa apenas, mas várias causas e cada causa tem seus fatores”, disse.

Para Geneci, a culpa da soltura dos acusados de crimes não é do judiciário, mas do legislativo: “é claro que não vamos acabar com a criminalidade por decreto, mas as leis ajudam. O judiciário só solta porque tem uma lei coagindo o juiz a soltar, essa é a expressão, o juiz solta por culpa da lei”.

Geneci afirma ainda que um dos fatores do aumento da criminalidade, em sua visão, é a impunidade. “É a impunidade e a sensação de impunidade. Aquela que a população percebe que os criminosos estão soltos e a demora processual faz com que muitas vezes haja a prescrição processual. Isso leva muitas vezes a se fazer justiça com as próprias mãos porque não acredita mais na justiça”, disse ele.

 

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